quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A volta em nome da SAUDADE

Hoje a saudade bateu mais forte.

Saudade das minhas férias em Umarizal. De quando pedia dinheiro a vovó para comprar chocolate. De quando brincava de Silvio Santos na área da casa de tia Celeste, jogando as cartas do baralho e perguntando “Quem quer dinheiro?”. Das perguntas que Madrinha (vó) fazia toda vez que chegava: “Sua mãe tá bem? E seu pai? Zuleide ainda tá gordinha?”

Nossa.... Sinto inclusive o frio de chegar durante a madrugada e o barulho das pisadas nas pedras das ruas, que ainda não eram calçadas, e que me levavam até a casa de esquina, onde eu e meus primos gastamos nossa infância.

Hoje a casa não tem a mesma aparência. Nem poderia. Seus moradores originais já não estão por lá...

Volto a escrever neste espaço para homenagear Dona Antônia, minha avó e uma das responsáveis pelos ensinamentos e valores que carrego hoje. Sua partida ainda mexe com sentimentos que parecem adormecidos e de repente, gritam, precisam sair. Seu colo faz falta. O toque de suas mãos também. Por isso a saída é buscá-la em palavras...

Deixo aqui uma simples e apressada homenagem lida após a missa que marcou um ano de nossa despedida.

Há mais ou menos 11 meses eu estava aqui, frente a vocês, ainda sob o impacto de uma perda recente. Com o coração machucado e uma sensação de que deveria ser diferente, tentava traduzir para o mundo, a dor de uma família que viu sua torre forte, sua matriarca, sua Antônia partir - como o matuto costuma dizer - como um passarinho.

De lá para cá um ano se passou. Os primeiros dias, os mais difíceis. Como aceitar o fato de não vê-la mais? Os cheiros ainda estavam vivos. Seus vestidos e camisolas ainda no armário faziam com que olhássemos para sua cama na intenção de encontrá-la. Foi a fase mais difícil, já que relutávamos em acreditar no que acabara de acontecer.

Depois vieram dias em que a falta ainda machucava, mas já lembrávamos com saudosismo dos momentos em que ela nos fizera rir. E não foram poucos. Nessa fase, as fotos que antes precisaram ser guardadas passaram a ser uma saída para um coração que, por mais racional que tentasse ser, ainda precisava tê-la ao alcance dos olhos.
Hoje descobri que em se tratando de saudades, o tempo é o melhor dos remédios. Nem sempre as novelas acabam como a gente quer. Sei. Parece piegas. Mas assim como as novelas, a vida real também não. Estamos submetidos ao ciclo nascer, crescer, reproduzir e depois morrer, por mais que isso soe cruel.

É isso que nos faz crescer, nos torna maduros o suficiente para aceitar a morte não como um ato egoísta, mas como o fim de um ciclo. E com Madrinha não foi diferente. Sua missão foi cumprida e, modesta parte, nos deixa orgulhosos pelo exemplo de caráter e retidão que poucos de nós alcançaremos.

Sei que é difícil aceitar a idéia de não vê-la, mas o legado que Madrinha deixou é maior que qualquer dificuldade. E quando falo de legado não me refiro apenas ao fato ter criado tantos filhos, mas aos valores. Valores que vão de uma ponta a outra. Estão alí em Dona Socorro e que chegarão ao bebê que Dayanne carrega no ventre.

É difícil imaginar ainda que as próximas gerações não terão o prazer de sentar ao seu lado, brincar com a casca da laranja que era retirada com todo cuidado para não quebrar, ou passar em frente a sua casa alí na esquina e vê-la sentada na calçada ou deitada na rede que por tantos anos ficou armada perto da porta o beco. E por eles eu fico triste. Mas cabe a cada um de nós, reviver a Madrinha que está na nossa memória, diariamente, para que ela jamais seja esquecida.

Quero deixar aqui mais um pedido: Não chore mais pela passagem da nossa Antônia, muito menos insista em se perguntar porque tem que ser assim. Lembre-se dela feliz; do seu sorriso; do seu lugar preferido. Daquele dia em que ela puxou sua orelha e principalmente daquele momento seu e dela.

Quero encerrar essas breves palavras com um texto de Santo Agostinho, que acredito ser o balsamo para nossos corações...

A morte não é nada.
Eu somente passei para outro lado do Caminho.
Eu sou eu, vocês são vocês.
O que eu era para vocês,
Eu continuarei sendo.

Me dêem o nome que vocês sempre me deram,
Falem comigo como vocês sempre fizeram.
Vocês continuam vivendo no mundo das criaturas,
Eu estou vivendo no mundo do Criador.

Não utilizem um tom solene ou triste,
Continuem a rir daquilo que nos fazia rir juntos.
Rezem, sorriam, pensem em mim.
Rezem por mim

Que meu nome seja pronunciado como sempre foi,
Sem ênfase de nenhum tipo.
Sem nenhum traço de sombra ou tristeza.
A vida significa tudo o que ela sempre significou,

O fio não foi cortado.
Porque eu estaria fora de seus pensamentos,
Agora que estou apenas fora de suas vistas?

Eu não estou longe,
Apenas estou do outro lado do Caminho...

Você que aí ficou, siga em frente,
A vida continua, linda e bela como sempre foi.

Umarizal, 07 de Agosto de 2011

Que a cada palavra, Madrinha se faça entre nós e de onde estiver, nos proteja.

Abs
Italo Amorim =~